domingo, 11 de janeiro de 2009

Falar de moralização e dar o exemplo

Reforçar a família e a escola, e tornar a sociedade menos corrupta e mais solidária, são, em poucas palavras as prioridades defendidas pelo Presidente da República no discurso de fim do ano. Realçou também que ambas as coisas exigem mudança de mentalidade na nossa sociedade. Uma mensagem simples e clara, e por isso apropriada para servir de fonte de inspiração para a acção.

A eficácia – para provocar mudança - deste tipo de mensagem é por vezes limitada pelo cepticismo de quem ouve. Cepticismo em relação à dificuldade da tarefa e em relação ao real compromisso com aquelas prioridades. Seja este cepticismo fundado ou não, a verdade é que a descrença causa, ela própria, bastante dano. A falta de confiança causa paralisia e retira parte da energia necessária para a acção. É importante reconhecer que a “evolução” que o país tem sofrido no domínio da corrupção, da desestruturação das famílias e da educação, tem criado um sistema e uma cultura que se tem vindo a enraizar e que, por isso, não será facilmente desmontado. Chamar a atenção para os problemas e definir metas é importante, mas é provavelmente limitado para reverter práticas – muitas vezes até “premiadas” - que se foram desenvolvendo ao longo de décadas. Mesmo tendo em mente todas as questões acima vale a pena levar a sério – e cobrarmos uns aos outros para que sejam praticadas – as palavras do nosso Presidente.

Vou aproveitar a deixa dada pelo discurso que venho vindo a referir, para defender a necessidade de analisarmos as raízes da corrupção e a forma como ela se mantém e propaga. Questionarmo-nos abertamente sobre o fenómeno e tentar entendê-lo, pode ser o primeiro passo para aumentarmos as nossas chances de sermos eficazes nesse empreendimento de mudar mentalidades.

Várias questões poderão ser exploradas. Por exemplo, será que a corrupção e a desestruturação das famílias tende a verificar-se igualmente em todas as classes ou é um problema dos níveis mais “elevados” da nossa sociedade? (“Elevação”, no sentido em que é usado aqui, refere-se apenas a riqueza material e poder, bem entendido). Já ouvi quem defenda que a crise moral nas sociedades é algo que está enraizado praticamente em todos. Os que defendem esta perspectiva, consideram que os que chegam ao topo não são menos morais do que os outros, são apenas mais hábeis a tirarem partido da imoralidade.

Seja qual for a resposta à questão, não há dúvidas que o comportamento dos ricos e poderosos, mesmo sendo criticado, serve de referência para muita gente. Ou seja, há um papel educativo (ou deseducativo...) no exemplo que os ricos e poderosos dão ao resto da sociedade. Por isso, eles possuem um real poder para provocar mudanças de mentalidade, através do seu exemplo. Poder que raramente usam de forma a moralizar.

Uma outra questão é, em que medida a pobreza e a privação são a raiz (ou, pelo menos, um factor importante) da corrupção e da dissolução familiar. É visível que há muita gente pobre que se esforça por ganhar a sua vida a trabalhar, de uma forma moral, e que se esforça por proteger a sua família. É também gritantemente visível que há muito rico que se apodera do que não é seu e que se comporta na família com a mesma atitude predadora que adopta na sociedade. Mesmo que seja verdade que a pobreza não gere, linearmente, imoralidade ou problemas na família, é evidente que levar uma vida de pobreza e ser, simultaneamente, constantemente exposto à riqueza exibicionista e acumulada pela via da esperteza, é susceptível de corromper. Parecem também evidentes os danos que causa à coesão familiar, a pobreza que, por exemplo, força as crianças a viverem na rua, sem acesso à atenção da família ou dos serviços de educação.

Deixo a sugestão que uma maneira de ajudarmos a concretizar a mudança de mentalidades referida pelo Presidente da República é (1) exigir um comportamento moral e exemplar, aos que estão em posições públicas, e servem por isso de modelo ao comportamento de outros, e (2) combater a pobreza retirando a pressão terrível que sofrem as famílias com menos posses e que acaba por se reflectir na sua coesão.

Membro do OPSA

Sem comentários: