sexta-feira, 20 de junho de 2008

O Homem Novo

Um dos sonhos mais belos que nos trouxe a brisa forte da independência foi o de ser possível construir um Homem Novo. Como em muitas outras coisas, infelizmente, esta intenção passou a ser mais um elemento de retórica, do que um objectivo sempre presente nos passos que se foram dando no caminho da (re)construção do nosso País. Hoje, banido do vocabulário, o que vemos é mais uma aspiração a homens velhos, em particular nas suas componentes mais negativas: o egoísmo, o desperdício, a ostentação, a falta de respeito pelo outro.

O que poderá estar por detrás disto? Porque será que começa a ser generalizada a opinião, com algum fundo de verdade por certo, de que a nossa juventude está cada vez mais afastada dos valores que julgamos mais importantes, optando pelo culto da violência (que tem sido sublimada, em Luanda, pelo aparecimento dos gangs, tão ao estilo da cultura de violência urbana americana), e pelo ‘espertismo’, esse comportamento cada vez mais presente e que se caracteriza pelo total desrespeito pelo outro, na lógica de se ter como único objectivo o de se ser o primeiro. Os jovens procuram imitar os seus ídolos.

Penso, sinceramente, que os princípios que apressadamente se procuraram incutir na nossa sociedade, com o advento da economia de mercado, instituindo o culto da riqueza material como expoente do sucesso, levam, naturalmente, a que princípios tão importantes como o altruísmo, a solidariedade, e a justiça, se percam. Daí ao desrespeito pelo outro vai um pequeno passo, que é, infelizmente, dado cada vez mais frequentemente. Estamos, ao estilo americano, a procurar construir uma sociedade de ganhadores e perdedores, e, como a experiência comprovada nos países que se guiam por essa lógica nos pode demonstrar, os perdedores são a maioria.

Se o Homem Novo é uma utopia, não deixa de ser uma pela qual vale a pena lutar. A transformação da escola num centro efectivo de educação, e não apenas num local de obtenção de conhecimentos (muitas vezes apenas de um papel que certifique que se tem determinados conhecimentos, que efectivamente não se tem), parece ser um passo essencial para que se possa fazer algo nesse sentido. Valorizar os professores, investir neles, e fornecer-lhes as ferramentas (a par de um salário digno) para que possam transformar os alunos em cidadãos responsáveis, capazes de trazer desenvolvimento e evoluir na vida, não deixando de respeitar o outro e o ambiente, parece ser um primeiro e decisivo passo. Criar uma consciência social generalizada, em que os valores fundamentais como a responsabilidade social, a solidariedade, a honestidade, a dignificação do trabalho, estejam presentes em cada acto governativo, em cada manifestação do poder, e, em particular, no exemplo de todos aqueles que devem surgir como referências na nossa sociedade, parece ser o outro passo fundamental.

Mas para isso seria preciso menos ostentação e mais solidariedade. Igualdade de facto perante a lei, e menos actos que demonstram que há uns mais iguais que outros. Mais respeito pela fila, nos constantes engarrafamentos que uma sociedade em transformação acelerada como a nossa tem que criar, e menos intermitentes e sirenes prepotentes espezinhando todos aqueles por quem se passa, sem sequer se olhar, a não ser de soslaio, e com desprezo.

São precisos Homens Novos para construir o Homem Novo.