terça-feira, 19 de agosto de 2008

Ainda o “Xé menino não fala política”?

Deveremos, na sociedade civil, falar de política? Ou será melhor ficarmos calados por isso ser tema reservado aos partidos políticos?

Será que mesmo neste período de campanha eleitoral ainda é de defender o “xé menino não fala política” para quem não seja político profissional? Tudo indica que está já ultrapassada nos meios oficiais a ideia - amplamente divulgada em Julho de 2007 e que ouvimos da boca de políticos, jornalistas e funcionários do estado - de que várias organizações estavam a envolver-se em domínios que são monopólio dos partidos políticos. Espero bem que essa ideia esteja realmente ultrapassada e que não estejamos apenas a viver uma pausa devida às eleições.

Sempre pensei que o único monopólio dos partidos políticos era o de concorrer às eleições, embora entre nós seja possível um partido político legal estar impedido de concorrer às eleições. É bizarro mas é provavelmente melhor do que ter centenas de “partidos” que apenas servem para consumir subsídios sem representarem para os eleitores reais opções de escolha. Esperemos que estes que ficaram de fora da corrida ao poder não se desinteressem do debate político, mesmo que não tenham a possibilidade de ser eleitos. É exactamente o interesse no debate político – e o direito a participar nele – que não deve ser negado a ninguém.

Infelizmente ainda vemos pessoas a advogar que as organizações da sociedade civil devem adiar as suas realizações e absterem-se de tomar posições públicas, por estarmos em período de campanha eleitoral. Preocupa-me esta linha, particularmente quando vem de pessoas activas em organizações da sociedade civil. Não será que deveremos defender o contrário? Não será que deveria ser agora o preciso momento de todos os cidadãos serem activos e discutirem e envolverem-se com os partidos no sentido de se conseguirem compromissos relativamente às políticas futuras? Estou essencialmente a pensar nas políticas que poderão ajudar a libertar Angola da pobreza e da exclusão social e dos outros os males que daí resultam. É evidente que este engajamento de que falo exige mais do cidadão do que apenas correr com bandeiras, vestir uma t-shirt, colocar um boné, buzinar o carro ou a moto (para os que tiverem) ou responder em coro com a multidão quando alguém, a partir do palanque e do microfone, nos faz uma pergunta. Atenção que não tenho nada contra esta dimensão carnavalesca da política, entendo até que ela dá energia e cria coesão indispensável para outras coisas. Mas não será o momento das organizações da sociedade civil promoverem também o tipo de envolvimento onde o cidadão se engaja no processo com a sua voz, transmitindo as suas ideias e experiência?

Se não conseguirmos fazer isso agora seguramente que ainda nos será mais difícil, no pós eleições, mantermos sob observação os que forem eleitos e desenvolvermos a capacidade de lhes recordar regularmente o muito que nos prometerão agora.

No dia 7 e 8 deste mês, na Universidade Católica, o auditório esteve quase sempre cheio de pessoas que debateram exactamente esta relação entre a sociedade civil e a política. Foi um debate interessante e rico pela diversidade de perspectivas e pela qualidade das abordagens. A transmissão em directo, pela Rádio Ecclesia, e pela internet, contribuiu também para alargar a audência aos que não estavam na sala e permitiu que mesmo pessoas que estão fora do país acompanhassem os trabalhos. Foi também lançado um livro sobre o mesmo tema, livro que contou com a contribuição de várias dezenas de autores, de diferentes nacionalidades. O livro e os debates parecem-me extremamente oportunos por estarmos num momento privilegiado para discutir ideias. Por isso, quando vos vierem com o “xé menino não fala política...” respondam com convicção que isso já é falar de política! Política de omissão e de passividade. Neste momento desde o Presidente da República aos partidos da oposição, estamos todos a falar de cidadania. Vamos então exercê-la.

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