domingo, 21 de junho de 2009

Onde Estávamos Nós?

"A perversão do crescimento económico e seus resultados começa quando procuramos substituir a escassez de serviços públicos por privados, procurando no sector privado um triste refúgio para a frustração social. (The perversion of economic growth and its fruits begins when we attempt to make up for the scarcity of public goods by producing more private ones, and to find in private consumption a barren solace for social frustration.)" Roberto Mangabeira Unger

Quando li o texto de Prince Mashele no Mail & Guardian Online, não pude deixar de reparar nas semelhanças que existem entre as sociedades sul-africana e angolana, em particular, e, de um modo geral, entre todas as sociedades dos países eufemisticamente considerados em vias de desenvolvimento, nomeadamente aqueles que conseguiram criar bolsas de riqueza num mar de pobreza e injustiça.

Mas isto é já por demais conhecido, e, tal como com os antibióticos, tornou-se tão comum referi-lo, que o nosso organismo, a nossa consciência, deixou de ser afectada por este tipo de preocupação. Construímos o nosso mundo, de janelas pintadas, e esquecemo-nos dos outros.

O que gostei no artigo que refiro, é a forma directa como somos confrontados com a realidade. É tão fácil refugiarmo-nos num microcosmo que construímos, até para satisfazer a nossa necessidade de nos sentirmos bem connosco próprios… É a técnica da caridade cristã. Faz-se uma boa acção por dia, e podemos ficar de bem com a nossa consciência. Entretanto colocamos, se podemos, os nossos filhos em escolas privadas, ou mandamo-los para o exterior, vamos a clínicas privadas, e até contratamos segurança privada para proteger os bens que acumulamos… Como dizia Maiakovski num célebre poema, enquanto a injustiça se desenrola no quintal do vizinho, viramos a cara para o lado. Mas há um dia que ela nos irá tocar. É inevitável. E aí colocar-nos-emos a pergunta, talvez demasiado tarde: onde estávamos nós quando se começou a registar a falência das instituições públicas? Aquelas que devem garantir, a todos, um nível aceitável de serviços, e de vida?

Acredito sinceramente que só com o exemplo de quem lidera se pode fazer com que os liderados ajam de forma a que o país avance na direcção certa. E isso é uma responsabilidade que começa nos dirigentes do País, e se estende por todos os que podemos, nas nossas áreas de actividade, influenciar aqueles com quem lidamos.

Temos que gostar do nosso país. Mas é fundamental que isso não seja apenas um sentimento abstracto. Não basta deleitarmo-nos com as paisagens, ou os acidentes naturais de que profusamente a mesma se encontra polvilhada, nem exultarmos com as vitórias das nossas selecções. É preciso termos orgulho das nossas instituições. Só quando pudermos falar com orgulho dos nossos políticos, da nossa administração pública, da nossa polícia, dos nossos hospitais e escolas públicos, é que poderemos sentir verdadeiro orgulho em Angola.

E para isso, como dizia Bertold Brecht, não basta lutar um dia, apesar de isso já ser bom. Para que sejamos imprescindíveis, teremos que o fazer toda a vida.

4 comentários:

Walnandes disse...

Obrigado pelo texto! Muito pertinente e convidativo à reflexão.
Parabéns e bom trabalho!

Chacate Joaquim disse...

(In)felizmente há quem nos convida a não prestar atenção aos ídolos ou aos nossos curroptos dirigentes (ignorando os seus erros) e nos limitarmos a pagar impostos!

Anónimo disse...

Caro colega: Estou a trabalhar na pesquisa para um documentário da Margarida Cardoso que reflecte sobre a história de Portugal e Angola desde os tempos da luta anti-fascista, dos movimentos de libertação até ao pós-Independência, através do retrato da geração de 60 que viveu intensamente este período. O filme pretende acima de tudo ser uma reflexão emocional e pessoal sobre um tempo de grandes e importantes mudanças Históricas.
Se tiver imagens de Angola dos anos 60/70 ou informações a partilhar connosco por favor faça-nos saber.

cumprimentos, marta rodrigues

Victor Fontes disse...

Cara Marta, só muito tarde vi o seu comentário, pelo que peço desculpa. Felizmente começa a ser fácil encontrar na net sites com imagens de Angola do período que refere. O Sanzala Angola é dos que mais informação tem. Atentamente Victor Fontes