terça-feira, 24 de fevereiro de 2009

Laços que não se apagam

A visita de Raul Castro ao nosso país foi um acontecimento de rara carga emocional. Cuba não nos pode ser indiferente. Admito que não desperte o mesmo tipo de emoção em todos nós. Nem todos estávamos do mesmo lado. Mas todos temos que reconhecer o papel decisivo que nuestros hermanos tiveram no pré e pós 11 de Novembro de 1975.

Para mim, Cuba é o expoente da coerência na luta desinteressada por um ideal. A forma como aquele pequeno país das Caraíbas se envolveu sem hesitações num processo de desfecho imprevisível, com adversários directos temíveis, e sob a sombra do gigante do Norte, é, no mínimo, exemplar. Só o simples facto de ser um pequeno país, com poucos recursos materiais, que só podiam emprestar a enorme força do ideal por que lutavam, e o seu sangue, os tornavam únicos. E foi assim. Cuba não foi apenas o génio e sacrifício de heróis como o Comandante Arguelles, o arquitecto da batalha do Ebo, decisiva para se travar o avanço sul-africano em direcção a Luanda, naquele 1975 conturbado, em que procurávamos salvar uma bandeira. Foi, quiçá principalmente, o espírito exemplar dos médicos, dos professores, dos internacionalistas que por aqui passaram, sempre com humildade e sentido de sacrifício a que não podíamos ficar indiferentes.

A História recente de Angola está indubitavelmente ligada al Caimán… E os reflexos permanecerão por muito tempo. Não só porque ela acabou por ser marcada por decisões que foram tomadas em momentos críticos, e que influenciaram o curso dos acontecimentos, como pelos milhares de jovens que foram acolhidos na ilha caribenha para receberem formação aos mais vários níveis.

Quando Fidel se manteve fiel à ortografia, e fez lembrar que Neto se escrevia com ‘e’, estava a influenciar a História. Quando decidiu que não podia ficar indiferente aos avanços dos carcamanos, e se uniu às FAPLA em direcção ao Calueque, e no Cuito-Cuanavale, estava a escrever a História. Quando, após os acordos de Nova York que levaram à independência da Namíbia (onde estava a continuação da nossa luta), os internacionalistas cubanos regressaram à sua terra natal, com os seus ideais, e os seus mortos, e o sentimento do dever cumprido, estavam a fazer História.

Mas nem só de grandes acontecimentos foi marcada a passagem dos cubanos por Angola. Eu recordo os meus professores cubanos com carinho. A abnegação do professor Santana, na reconstrução do laboratório de máquinas eléctricas do Departamento de Electrotecnia, ou a genialidade do Ivan, nas suas sempre impecáveis aulas de matemática. Os fins de semana que passavam, em zonas do teatro operacional, em acções de guarda a objectivos estratégicos, punham-nos de sentido! A disponibilidade e o rigor que demonstravam, faziam crescer o respeito que por eles sentíamos. Eram os pequenos gestos de quem tinha uma missão que transcendia a simples actividade de leccionar.

A vinda a Angola del Compañero Raul Castro foi um momento de rara emoção. Pelo menos para os que acreditam que se procurou com a independência encontrar um caminho que levasse à justiça social em Angola. A sua visita ao nosso mais velho Lara, foi um gesto que calou fundo. Não se esquecem os amigos.

Há laços que se criam com boas intenções. Outros, com a mistura do suor e sangue. Esses não se podem apagar.

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